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UFJF aprova reserva de 50% de vagas para ações afirmativas na Pós-Graduação

Em uma decisão histórica, o Conselho Superior (Consu) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) aprova a reserva de 50% de vagas para ações afirmativas em Programas de Pós-Graduação da instituição. “Em levantamento realizado por grupos que monitoram a efetividade das políticas afirmativas no Ensino Superior, tanto na Graduação como na Pós-Graduação, não percebemos nenhuma instituição que tenha alcançado um percentual dedicado às cotas semelhante ao que foi aprovado na UFJF até o momento”, adianta a Pró-reitora de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), Mônica Ribeiro de Oliveira.

Serão contemplados os grupos compostos por pessoas negras; pessoas oriundas de povos e comunidades tradicionais; pessoas trans (transgêneros, transexuais e travestis); pessoas com deficiência (PcD); e pessoas refugiadas, soliciantes da condição de refugiado e imigrantes humanitários.

50% é o maior percentual registrado no Brasil
Segundo levantamento da pesquisadora Anna Venturini, vinculada ao Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA – IESP/UERJ), a maioria dos percentuais dedicados às ações afirmativas em PPGs varia entre 20% e 30%. Determinados programas, dependendo do critério individual de cada um, estabelecem um mínimo de 20% e máximo de 50%. No caso da UFJF, a Resolução 67/2021 do Consu determina que o percentual de 50% de reserva de vagas deverá ser adotado por todos os PPGs da instituição.

Processo gradual
Resolução 67/2021 do Consu, que dispõe sobre a Política de Ações Afirmativas na Pós-graduação da UFJF, determina que a implantação deverá ocorrer progressivamente. Sendo assim, no primeiro ano da aplicação dessa nova norma, o percentual que deverá ser atingido é de, no mínimo, 30%. O valor será aumentado anualmente, em 5 pontos percentuais, até atingir o percentual inédito de 50%.

Bancas de heteroidentificação
O documento também estipula que o processo de homologação das solicitações de inclusão no grupo de cotistas será realizado por meio de bancas de heteroidentificação que, por sua vez, serão constituídas pelas instâncias competentes da administração superior da UFJF, a serem definidas em instrumento normativo próprio.

Câmara de acompanhamento
Também está prevista a criação da Câmara de Acompanhamento de Políticas de Ações Afirmativas na Pós-Graduação, a fim de acompanhar e apoiar os Programas de Pós-Graduação (PPGs) na implementação da Resolução 67/2021. Ela será composta por dois representantes da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp); um representante da Diretoria de Ações Afirmativas (Diaff); três representantes de coordenadores de PPGs, um de cada grande área do conhecimento; um representante dos servidores técnico-administrativos em educação (TAEs) e um representante discente.

Decisão histórica da UFJF
“Essa decisão reflete uma conquista dos movimentos sociais em nível nacional e, internamente, representa a capacidade e a sensibilidade de nossa instituição em acolher a reivindicação e se somar à luta desses grupos. Os grupos previstos na resolução são aqueles socialmente e historicamente marginalizados, e a reserva de vagas em cursos de Pós-Graduação, um campo tradicionalmente ocupado pelas elites, significa inclusão e pluralidade. Precisamos da diversidade para a produção de conhecimentos de excelência ao reunir diferentes experiências, vivências e epistemologias”, reforça a pró-reitora de Pós-Graduação e Pesquisa, Mônica Ribeiro de Oliveira.

A pró-reitora também ressalta que a decisão é fruto de ações compartilhadas entre a Pró-Reitoria de Pós-graduação, a Diretoria de Ações Afirmativas e a Pró-Reitoria de Assistência Estudantil, contando com a parceria com PPGs que já tinham aprovado cotas em seus colegiados, como os de Serviço Social, Educação, História, Psicologia, Ciências Sociais e Geografia. “Foram realizadas muitas reuniões, intensos debates foram travados e buscamos sempre acolher as demandas, mediar os possíveis conflitos e encaminhar saídas. O resultado foi um texto de resolução que contemplou todos os programas e deu um passo imenso para uma universidade mais inclusiva, além de representar um ato de resistência a esta fase caracterizada por posturas negacionistas e obscurantistas.”

O diretor de Ações Afirmativas da UFJF, Julvan Moreira de Oliveira, destaca que as políticas de ações afirmativas, no contexto brasileiro, não se tratam de concessões do Estado, mas configuram políticas de reparação a fim de superação de diferenças históricas, causadas por violações aos direitos humanos, como a escravidão de africanos e indígenas e a marginaliação de seus descendentes. “No Brasil, os negros (pretos e pardos) correspondem a 56,1% da população, mas estão ausentes e invisibilizados dos diversos espaços da sociedade, como docentes universitários, por exemplo.”

“O darwinismo social e o mito da democracia racial, assim como a tese de que as questões étnico-raciais estão subordinadas às questões econômico-sociais, fizeram que, durante anos, não se criasse as reparações históricas. É preciso reconhecer que essa é uma conquista do movimento social negro, que sempre lutou para assegurar e atender as demandas da população negra”, prossegue o diretor. “No Brasil, ainda é forte o pacto narcísico da branquitude, sendo necessário reafirmar que raça é determinante nas relações sociais. E, nesse sentido, a UFJF, ao aprovar as cotas na pós-graduação, dá um importantíssimo passo para a superação dessas desigualdades, especialmente por estarmos em Juiz de Fora, a terceira maior cidade brasileira em desigualdades econômicas entre brancos e negros.”

A pró-reitora de Assistência Estudantil, Cristina Bezerra, faz coro aos colegas. “Além de garantir o acesso ao mercado de trabalho, também é necessário garantir a formação de uma população qualificada. Por isso, essa medida é importantíssima no sentido de garantir o acesso de grupos historicamente excluídos à Pós-Graduação, que é um espaço de excelência em produção de conhecimento. Esse acesso, por sua vez, também enriquece e dinamiza a universidade, porque traz questões e dinâmicas societárias que dificilmente entrariam anteriormente.” Cristina frisa, igualmente, a importância dos próximos passos a serem tomados. “Precisamos nos desafiar a criar políticas de permanência para contemplar demandas necessárias para a assistência desses estudantes, envolvendo, por exemplo, moradia, alimentação e transporte.”

Em conclusão frente à decisão histórica da universidade, o diretor de Ações Afirmativas, Julvan de Oliveira, diz: “Penso que é preciso que a sociedade brasileira reflita e tome uma posição sobre o que queremos para esse país: se continuaremos a perpetuar a desigualdade existente entre nós – uma desigualdade que atinge profundamente a população negra e indígena, além das pessoas trans e homossexuais, mulheres e pessoas com deficiência – ou criaremos políticas para que sejamos, no futuro, um lugar onde todas as pessoas, independentemente de suas condições raciais e de gênero, sejam respeitadas e integradas em todos os espaços da sociedade.”

Fonte: UFJF (abre em nova janela)