Em homenagem ao dia Internacional da Mulher, a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) vai mostrar, ao longo do mês de março, algumas mulheres que fizeram e continuam a fazer parte do desenvolvimento científico, social e tecnológico. Estas grandes pensadoras mostradas na campanha são exemplos de como a mulher, mesmo com possibilidades limitadas por sociedades opressoras, foram fundamentais para evolução da humanidade.  

Na mitologia grega, a sabedoria e as artes eram os domínios de Palas Atena, a imponente deusa nascida da cabeça de Zeus e cultuada do Mediterrâneo à África. Curiosamente, na cidade batizada em sua homenagem, suas filhas não podiam frequentar a ágora ou participar dos debates públicos: desde muito cedo, a ciência era terreno dos homens, e mantida assim com muito apego. Desde o tempo das mulheres de Atenas, pensadoras e cientistas enfrentaram diversas oposições para ocupar seu espaço nos laboratórios e nas Universidades. Nesta campanha, vamos lembrar algumas das mulheres que fizeram história — com seus feitos na Ciência e com suas próprias trajetórias — e homenagear aquelas que, na UFJF, continuam a fazer.

Zélia

“Meu trabalho está só começando, ainda tenho muita luta pela frente”. Zélia é física, colabora com a Nasa e desenvolve novos materiais, especialmente vidros. (Fotos: Gabriel Kern)

Luta histórica

Desafiando a segregação racial nos EUA e a desconsideração de seus colegas homens — durante sua época, era incomum que pesquisadoras assinassem artigos em periódicos, por exemplo –, Mary Jackson (1921 – 2005) foi a primeira engenheira negra a trabalhar na NASA. Uma das cientistas representadas no filme Estrelas Além do Tempo (2016), Mary atuou como ativista, incentivando outras mulheres negras a adentrar a carreira científica.

Quase uma década após o falecimento da pesquisadora, Zélia Ludwig — física, professora do Instituto de Ciências Exatas da UFJF, e colaboradora da NASA na construção de uma plataforma lunar — fundou a página “Mulher, Ciência e Sociedade”, buscando divulgar estatísticas da presença feminina na Academia. Mulher negra, Zélia passou a pesquisar mais intensamente a trajetória das mulheres na carreira científica. Visitando escolas e ministrando palestras, a professora busca incentivar mais meninas a seguirem no campo das Ciências Exatas, além de oferecer ferramentas “para lidar com o machismo na Academia, para lutar contra a desigualdade, o assédio e o preconceito de todo tipo”. Mesmo vislumbrando os avanços da presença feminina na ciência, Zélia aponta que ainda existe um caminho longo a ser trilhado.

“Cansada das injustiças pelas quais vinha passando e vendo outras meninas enfrentando situações similares, decidi investir no estudo da temática do feminismo científico, lutar contra a desigualdade, o assédio e o preconceito de todo tipo dentro da academia”.

“Meu trabalho está só começando. Ainda tenho muita luta pela frente, para que nossas informações possam ser contadas para essa e para outras gerações. Para que nosso trabalho não se perca, abafado em meio aos espinhos, mas que sirva de incentivo para outras meninas e mulheres,” comenta Zélia.

Respeito em todos os campos

Márcia

“Conquistar o respeito profissional era uma luta diária”. Márcia é Administradora de Empresas deixou a iniciativa privada para se dedicar a pesquisa e transferir o conhecimento por meio da docência. (Foto: Gabriel Kern)

Para Ada Lovelace (1815 – 1852), a primeira programadora da história, a pesquisa começou ainda cedo, incentivada por sua mãe (também estudiosa da matemática). Convidada para trabalhar com o cientista Charles Babbage — inventor da máquina analítica –, aos 28 anos de idade, Ada publicou uma série de notas, descrevendo o funcionamento dessa tecnologia e propondo suas aplicações.

Em 1953 — mais de um século após seu falecimento — pesquisadores reconheceram suas publicações, onde encontraram conceitos similares aos softwares e aos cartões perfuráveis (utilizados por programadores nos primórdios da computação do século XX). A máquina nunca foi construída, porém as ideias para a tecnologia serviram de base para a programação moderna.

Já para a professora da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da UFJF, Márcia Cristina Machado, a paixão pela ciência não aconteceu à primeira vista. Sem pretensões de seguir a carreira acadêmica, ainda durante a graduação, ela começou a trabalhar como administradora em uma empresa multinacional, ocupando outro espaço tradicionalmente masculino.

Esse aprendizado prático, que mais tarde contribuiria para sua atuação como professora e pesquisadora, veio acompanhado de problemas. “Duas foram as razões que me levaram a desistir da carreira empresarial e buscar novos rumos. Primeira, sentia-me limitada na busca de novos conhecimentos; descobri que gostava mesmo era de estudar.”

A segunda, conta a professora, era a dificuldade de ser mulher no ambiente de negócios da década de 1980. “Conquistar o respeito profissional era uma luta diária e as brincadeiras maldosas, comuns. Enfim, cansei e resolvi voltar a estudar. Pedi demissão e fui fazer mestrado, o que acabou sendo um marco na minha jornada. Descobri a paixão pela carreira acadêmica e não deixei mais de estudar.”

Docente da UFJF desde 2002, Márcia atualmente pesquisa estratégia em pequenas empresas e gestão de escolas públicas, e aponta que o principal impacto de seu trabalho se dá através dos alunos: “Acho que há uma difusão de conhecimento através deles e procuro sempre compartilhar os resultados atualizados, adquiridos em pesquisa”.

“O ambiente da Universidade, particularmente o da UFJF, me permitiu descortinar duas condições fundamentais: a realização profissional através da docência e da pesquisa e ser respeitada pelo que sou e faço. Quando comecei aqui, era talvez a única professora no departamento de ciências administrativas e isso nunca foi um problema. As diferenças podiam ser de ordem ideológica, teórica ou de visão acadêmica, mas nunca de gênero.”