Caique Cahon

Nas férias, sem a parte didática, laboratórios ficam totalmente voltados ao desenvolvimento de pesquisas (Foto: Caique Cahon)

Ainda que os corredores de salas de aula estejam vazios, a produção científica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) não para, nem mesmo durante o recesso acadêmico. Nos laboratórios, o ritmo de trabalho dos pesquisadores permanece – são experimentos, pesquisas e estudos com prazos a serem cumpridos e investimentos a serem devolvidos à sociedade.

A situação é mais evidente nas áreas de biológicas, saúde, exatas e engenharias. “Temos a obrigação de cumprir contratos e a pesquisa não para. A gente tem que produzir, a dedicação é necessária durante o ano inteiro”, diz o pesquisador Moisés Vidal Ribeiro. Ele trabalha com sistemas de comunicação via rede elétrica e já depositou diversas patentes, além de ter parceria com instituições estrangeiras e companhias de energia do país.

No Laboratório de Processamento de sinais e Telecomunicações da Faculdade de Engenharia, atualmente, são desenvolvidos projetos com foco na “Internet das Coisas” ou “Internet of Things” — a conexão via internet de diversos aparelhos usados em nosso dia a dia, como televisores e geladeiras, e em cidades inteligentes.

Segundo Ribeiro, coordenador do laboratório, o curto recesso para as festas de fim de ano serve como descanso, mas as atividades voltam já nesta segunda semana de janeiro. “Os alunos de graduação que fazem parte do grupo também voltam a trabalhar em janeiro. Se há alguma viagem marcada, negociamos, damos liberdade, mas trabalhamos com metas.”

Moisés Ribeiro

Moisés Ribeiro, autor de diversas patentes e ganhador de prêmios de inovação, diz trabalhar com metas no Laboratório de Processamento de Sinais e Telecomunicações

O pesquisador André Marcato, da área de robótica, colabora. Ele frisa o volume de trabalho que a pesquisa exige. “Na pós-graduação, existem prazos que devem ser rigorosamente cumpridos, então os alunos continuam engajados na pesquisa para defenderem seus trabalhos, já que as bolsas também não são prorrogadas.” Marcato participa de atividades com o Grupo de Robótica Inteligente (GRIN) e com o Laboratório de Sistemas de Potência (Labspot), responsáveis pela elaboração de diversos projetos como o uso de uma patrulha de robôs para a otimização de sistemas de energia de grande porte.

Na área de ciências biológicas, a UFJF possui dezenas de laboratórios, da microbiologia à nutrição. “As pesquisas são feitas em fluxo contínuo, sem parar, e nós continuamos em atividade com os alunos”, explica Priscila Faria, pesquisadora do Laboratório de Estudo de Estrutura e Função de Proteínas e professora do departamento de Bioquímica. O uso dos laboratórios depende do plano de trabalho de cada aluno e dos equipamentos necessários para se realizar cada projeto.

Entre os experimentos, Priscila cita os ensaios sobre a imunogenicidade de parasitas, ou seja, a capacidade de induzir e reagir uma resposta imunológica. O objetivo é aplicação em diagnóstico, imunoterapia e/ou vacina. “Também são feitas análise dos efeitos de drogas sintéticas e de produtos naturais anti-parasitários, com a intenção de contribuir no estudo dos mecanismos de ação, e encontrar inibidores específicos para enzimas presentes nos parasitas”, exemplifica.

Responsabilidade com os animais e atendimento à população

Outro local conhecido dos pesquisadores dentro da UFJF é o Centro de Biologia da Reprodução (CBR).  Nele estão os animais utilizados em pesquisas clínicas e pré-clínicas em ensaios toxicológicos, farmacológicos, nefrologia, reprodução humana e animal. “Em nossos laboratórios, somos responsáveis por manter as condições necessárias para o bem estar dos animais, bem como manter os dados das pesquisas de todos os estudantes, tanto da graduação, quanto da pós, que utilizam o modelo animal em experimentos científicos”, conta a diretora do CBR e professora do departamento de Biologia, Vera Maria Peters. Conheça mais sobre o trabalho do centro.

No CBR (Foto: Alexandre Dornelas)

Local conhecido dos pesquisadores, o Centro de Biologia da Reprodução deve manter todos os dados das pesquisas com animais atualizados de janeiro a janeiro (Foto: Alexandre Dornelas)

Ainda na área da saúde, muitos trabalhos desenvolvidos na Faculdade de Farmácia precisam cumprir os prazos na produção científica e ainda atenderem as demandas da população. No Laboratório de Microbiologia duas pesquisas relacionadas à conservação do leite cru e do queijo minas frescal, financiadas por agências, estão em andamento. “Nós fazemos um controle biológico de bactérias deteriorantes do leite cru e do queijo minas frescal, com vírus que atacam essas bactérias. O objetivo é prolongar a vida útil tanto do leite quanto do queijo”, conta o coordenador Humberto Húngaro.

Já o Laboratório de Análise de Alimentos e Águas (LAAA) presta serviços diretamente à população. O professor Húngaro explica que o local desenvolve análises laboratoriais físico-químicas e microbiológicas de amostras de águas e alimentos a custos reduzidos, como água mineral, natural, tratada e não-tratada, leite pasteurizado, queijos e manteigas. O material analisado pode ser direcionado ao consumo humano ou ser proveniente de indústrias, farmácias, hospitais e outros laboratórios.

Além das pesquisas, o professor Humberto Húngaro também atende a demanda da população no Laboratório de Análise de Alimentos e Água (Foto: Caique Cahon)

Além das pesquisas, o professor Humberto Húngaro também atende a demanda da população no Laboratório de Análise de Alimentos e Água (Foto: Caique Cahon)

O serviço é aberto à comunidade em geral, pessoas físicas, empresas e órgãos públicos. O cliente vai até o local ou liga para agendar o procedimento, que é feito mediante pagamento via Guia de Recolhimento da União (GRU), para financiar os insumos gastos na análise. O prazo pedido para entrega do resultado é de até 15 dias úteis. No caso de empresas, há a intermediação do Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (Critt), que auxilia na questão dos contratos e convênios. Os agendamentos também poderão ser feitos a partir desta segunda semana de janeiro, pelo telefone (32) 2102-3804. O laboratório está localizado no 1º andar da Faculdade de Farmácia.

A análise de materiais também faz parte do dia a dia dos pesquisadores de Química. No  Núcleo de Espectroscopia e Estrutura Molecular (NEEM), por exemplo, diversos laboratórios dão suporte aos trabalhos. “Temos mais de 20 estudantes envolvidos no desenvolvimento de pesquisas, tanto na área científica quanto na tecnológica. São alunos de iniciação científica, mestrado, doutorado e estagiários de pós-doutorado”, conta o coordenador do grupo professor Luiz Fernando Cappa de Oliveira. Para ele, o fato de no recesso não haver atividades didáticas previstas é até um atrativo para os pesquisadores. “É principalmente nas férias de verão  que os trabalhos de pesquisa são mais e melhor desenvolvidos, e planejados para os semestres vindouros”.

Compõem parte da infraestrutura usada pelos pesquisadores do NEEM, os laboratórios de Espectroscopia Molecular, usado em estudos de estrutura molecular em nível microscópico; o de Nanomateriais, o qual realiza toda a parte de síntese e aplicações de nanomateriais nos mais variados meios; o de Síntese, para a fase preparatória dos estudos; e o Microestrutural e de Análise, contando com um microscópio eletrônico de varredura e um analisador de partículas em suspensão. Há ainda pesquisas na área de tecnologia química, feitas por meio de um sistema de ultra alta temperatura para avaliar parâmetros em alimentos e outros produtos.

Produtividade acadêmica ainda pouco conhecida

Mônica Ribeiro (Foto Alexandre Dornelas)

Para a pró-reitora Mônica Ribeiro, compromisso social e com a inovação aumentou nos últimos anos (Foto Alexandre Dornelas)

Para a pró-reitora de Pós-graduação e Pesquisa da UFJF, Mônica Ribeiro, a sociedade brasileira ainda desconhece o papel das universidades e sua importância para a produção de conhecimento, materializada em produtos e processos para melhorar as condições de vida do país. Para enfrentar os cortes sofridos no orçamento, Mônica diz que a Universidade está mobilizada. “Estamos cientes que somente por meio do financiamento público à pesquisa e conduzido pelas universidades é que o país poderá sair da situação de dependência tecnológica, como mero produtor de commodities.”

Em relação à produtividade dos pesquisadores, a pró-reitora acredita que o engajamento hoje é maior do que no passado e há uma preocupação com a inovação. “Os pesquisadores estão mais conscientes de seu papel social. É uma mudança de cultura ​​científica muito importante para toda a sociedade brasileira.​”