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Gaudêncio Frigotto falará sobre mercantilização e imposição ideológica do pensamento único (Foto: Caique Cahon/UFJF)

A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) abre espaço para debater o Programa Escola Sem Partido (ESP), projeto de lei que tem gerado controvérsia em todo o país. No dia 18, o professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Gaudêncio Frigotto, referência em estudos de educação, ministra a palestra “Educação pública no atual contexto brasileiro: mercantilização e imposição ideológica do pensamento único”. O encontro acontece no Anfiteatro de Estudos Sociais da Faculdade de Direito, a partir das 19h e é uma iniciativa da Coordenação de Licenciaturas.

Segundo Angélica Cosenza, coordenadora de Licenciaturas e responsável pelo encontro, “o debate é muito atual e relevante, na medida em que pode alterar os rumos da educação no país”. O Movimento Escola Sem Partido inspirou uma série de projetos de lei em âmbitos municipal, estadual e federal. No caso de Juiz de Fora, influenciou o Plano Municipal de Educação, aprovado em março na Câmara dos Vereadores. “As discussões foram acirradas, especialmente em temas envolvendo diversidade, que tiveram forte oposição de grupos religiosos”, conta Angélica.

Frigotto também lançará o livro “Escola ‘sem’ partido: esfinge que ameaça a educação e a sociedade brasileira”, no Anfiteatro dos Estudos Sociais, às 20h30 desta quinta, 18.

O que é o Movimento Escola Sem Partido?
O Movimento já existe há vários anos, mas ganhou notoriedade a partir da discussão e aprovação de projetos de lei similares aos propostos no anteprojeto organizado pelo grupo. No site oficial, o grupo se posiciona “contra o abuso da liberdade de ensinar”, afirmando haver em sala de aula uma “doutrinação política e ideológica”, que “ofende a liberdade de consciência do estudante; afronta o princípio da neutralidade política e ideológica do Estado; e ameaça o próprio regime democrático”. Além disso, de acordo com a intenção é evitar a “usurpação do direito dos pais dos alunos sobre a educação dos seus filhos”, como assegurada no art. 12, IV da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Dentre as medidas propostas, a principal delas é a afixação nas salas de aula de um cartaz com os seguintes deveres do professor:

deveres

Segundo o professor da Faculdade de Comunicação da UFJF, Paulo Roberto Leal, o projeto parte de pressupostos equivocados sobre a realidade do espaço da escola. “Há professores com enorme diversidade de valores ideológicos”, diz. “Mesmo se essa esquerdização fosse verdade, essa ideia gera um efeito potencialmente incapaz de ser convergente com a atividade docente, que implica críticas, que implica o debate, a politização.”

O professor afirma que uma das tarefas da formação educacional é autonomizar as pessoas, permitindo uma participação mais ativa no mundo. “Portanto, cercear o debate sobre temas supostamente não convergentes com o espaço da escola é não perceber que a escola é um espaço no qual se debate a vida, a diversidade, os rumos da sociedade”, declara.

Angélica Cosenza, reforça: “A escola tem que estar conectada com a realidade, que é heterogênea. Oferecer esse pluralismo de ideias e visões de mundo permite que o aluno desenvolva o senso crítico e esteja apto para lidar com as diversidades do mundo”, observa. “O professor não é apenas um transmissor de conhecimento, mas um educador. E a Escola Sem Partido inibe essa função”.

Quais seriam as consequências da aprovação da Lei?
Angélica afirma que o ESP seria um retrocesso para o sistema de ensino e para a própria democracia. “Dentro desse contexto, não há espaço, por exemplo, para a discussão da cidadania e de temas como a diversidade, o que favorece ideais de grupos mais conservadores. É uma forma de desmonte do ensino e de precarização do trabalho do professor,” lamenta.

“Professores terão preferências políticas. A mídia tem preferências políticas, o judiciário, infelizmente, demonstra preferências políticas. Então, haver preferências políticas é do jogo. O cerceamento dessas visões de manisfestarem que é o problema”, explica Leal. “As consequências disso são muito perigosas para a democracia, para o direito dos docentes conduzirem debates públicos, sobre questões públicas. E isso faz parte do processo de formação dos alunos: serem apresentados a diferentes pontos de vista, outras realidades, para desenvolver olhares mais críticos e, portanto, fazerem escolhas autônomas.”

Leal ainda aponta que o projeto pode causar um desequilíbrio político: “em algum momento, alguém se achará no direito de dizer o que pode e o que não pode ser discutido na sala de aula, quais são os debates políticos e quais não são, o que é um debate admissível. Propostas assim são instrumentos que geram consequência protofascistas.”