Apresentações musicais marcaram homenagem a krenak (Foto: Alexandre Dornelas)

Apresentações musicais marcaram homenagem a Krenak (Foto: Alexandre Dornelas)

A UFJF concedeu, na noite da última quinta-feira, 18, o título de professor Honoris Causa a Ailton Krenak, uma das maiores lideranças do movimento indígena brasileiro. Com o ato, promovido pelo Conselho Superior (Consu), a Universidade foi a primeira instituição a reconhecer a importância do trabalho de um mestre do Encontro de Saberes.

O ministro da Cultura, Juca Ferreira, que veio a Juiz de Fora especialmente para o evento, destacou a importância deste ato. “A UFJF abriu uma porta para a construção de uma relação de respeitabilidade e afetividade com os povos indígenas. Ato que sinaliza uma mudança, em um país que maltrata tanto seus filhos. A Universidade se torna maior ao valorizar o saber tradicional, que é uma construção coletiva de todo um povo.” Ainda conforme o ministro, “os significados deste momento, que são muitos, farão reverberar muitas influências positivas sobre o Brasil”.

A sessão solene ampliada do Consu foi realizada no auditório do Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm) e contou com a presença de vários representantes de povos indígenas, como Álvaro Tukano, Dauá Puri, Daniel Munduruku, entre outros.

"Estamos em uma empreitada de descolonizar as nossas mentalidades", disse Krenak

“Estamos em uma empreitada de descolonizar as nossas mentalidades”, disse Krenak (Foto: Alexandre Dornelas)

Krenak agradeceu a homenagem, que classificou como uma celebração rica de significados. “Esse reconhecimento de uma universidade com a importância da UFJF em nosso país chama a atenção da população para um segmento menos visível de nossa história e cultura. Fico muito honrado em poder ampliar, no sentido coletivo, esse conhecimento.”

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Ainda segundo Krenak, os cânones que orientaram o conhecimento acadêmico até hoje ficaram muito limitados a uma visão europeia e colonial, por isso a importância da valorização do saber tradicional. “Nós estamos em uma empreitada de descolonizar as nossas mentalidades e a universidade tem um papel fundamental nesse sentido. A UFJF saiu na frente de um debate que vai ser importante para nosso país nos próximos anos.”

“Nós estamos em uma empreitada de descolonizar as nossas mentalidades e a universidade tem um papel fundamental nesse sentido.”
Krenak

Para o vice-reitor no exercício da Reitoria, Marcos Chein, Aílton Krenak já era, no início dos anos 80, líder de um movimento que nascia à margem e era repudiado por tantos nacionais e por um governo violento e ditatorial. “Aílton lutou e luta contra preconceitos, contra estereótipos criados na base de uma cultura de colonialidade do poder e do eurocentrismo. Aílton não desistiu, assim como tantos outros. Hoje ele está aqui não para receber apenas um reconhecimento por sua luta, mas para nos ensinar, para compartilhar seus saberes tradicionais, para fazer parte de nossa universidade e para nos lembrar de quem realmente somos e a quem pertence a universidade.”

Confira o discurso de Marcos Chein na íntegra

Hoje ele está aqui não para receber apenas um reconhecimento por sua luta, mas para nos ensinar, para compartilhar seus saberes tradicionais, para fazer parte de nossa universidade e para nos lembrar de quem realmente somos e a quem pertence a universidade", destacou Chein (Foto: Alexandre Dornelas)

“Hoje ele está aqui não para receber apenas um reconhecimento por sua luta, mas para nos ensinar, para compartilhar seus saberes tradicionais, para fazer parte de nossa universidade e para nos lembrar de quem realmente somos e a quem pertence a universidade”, destacou Chein (Foto: Alexandre Dornelas)

Para o coordenador do curso, professor Daniel Pimenta, a oferta desse tipo de conteúdo na academia é de fundamental importância. “A sociedade ocidental está em um processo de autodestruição com escasseamento dos recursos naturais. As sabedorias ancestrais não trabalhavam com essa agressividade de produtividade que existe hoje. Ao trazermos essas sabedorias para a universidade, estamos ampliando nossa visão para conhecimentos que foram marginalizados pelo preconceito capitalista. É importante discutir, abrir a cabeça e traçar novos caminhos”.

Atualmente, cerca de oito mil indígenas cursam o ensino superior no país, número que é praticamente o dobro de 2010, antes da implantação, em todas as instituições federais, da Lei de Cotas. Para o ministro da Cultura, esse é um grande instrumento para dotar os povos indígenas de conhecimentos e tecnologias. “É um importante caminho para que sejam senhores de seus destinos. Assim, terão condições de relacionarem-se com a sociedade contemporânea em pé de igualdade”, destacou Juca Ferreira, em seu discurso.

Segundo Krenak, essas pessoas, que não frequentavam a academia, vão passar a produzir conhecimento sobre suas realidades. “O Brasil é um país de grande diversidade, mas precisamos fazer essa diversidade interagir e que ela resulte em algo melhor, que possamos melhorar.”

A cerimônia contou, ainda, com apresentações musicais do grupo Maracatu Estrela na Mata, do flautista Estêvão Teixeira, que compôs uma música especialmente para Krenak, acompanhado dos músicos Caetano Brasil, Luciano Baptista e Lucas Soares, ao som de tambores do Ingoma.

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Encontro de Saberes

O projeto Encontro de Saberes, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, está presente na UFJF e em mais quatro universidades brasileiras. São elas as federais de Minas Gerais (UFMG), Ouro Preto (Ufop) e do Pará (UFPA) e a estadual do Ceará (Uece).

O projeto é coordenado pelo professor e antropólogo José Jorge de Carvalho, da Universidade de Brasília (UnB), que esteve na UFJF para abertura do curso em 2014. O objetivo é trazer para os alunos os mestres e mestras da sabedoria popular nas mais diversas áreas de atuação, desde sábios em arte à mestres em saúde e tecnologia passando pela cosmologia, espiritualidade, meio ambiente e psicologia.

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