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Phillipe Vilaça Gomes está no terceiro semestre do doutorado em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (Feup), em Portugal. Há menos de dez anos trabalhava como marceneiro e ainda não concluíra o ensino médio. Pagou seu curso preparatório para o vestibular trabalhando em uma fotocopiadora e passou, pelo grupo de cotas da escola pública, em 3º lugar no curso de Engenharia Elétrica da UFJF.

Foi monitor de duas disciplinas e o empenho lhe rendeu uma aprovação no programa Ciência sem Fronteiras (CsF), em setembro de 2012, com previsão de término em junho do ano seguinte. “Participei de várias pesquisas científicas e recebi duas bolsas de iniciação do CNPq. Fui agraciado com a bolsa de “graduação-sanduíche” e, antes de concluir a graduação, consegui aprovação no doutorado na Universidade do Porto, também com bolsa integral concedida pela Capes, ambas no âmbito do CsF. O doutorado teve início em setembro de 2014”.

Phillipe escreveu quatro artigos científicos relacionados à sua linha de pesquisa (Planejamento da expansão do sistema elétrico), dentre os quais, três já foram publicados e um aceito para publicação. Alguns desses trabalhos foram desenvolvidos em parceria com professores da Feup e da UFJF, integrantes do Grupo de Otimização Heuristica e Bioinspirada (GOHB).

agraciado com a bolsa de “graduação-sanduíche” e, antes de concluir a graduação, consegui aprovação no doutorado na Universidade do Porto, também com bolsa integral concedida pela Capes, ambas no âmbito do CsF (Foto; Aqruivo pessoal)

Agraciado inicialmente com bolsa de “graduação-sanduíche” Phillipe conseguiu aprovação no doutorado na Universidade do Porto, com bolsa integral concedida pela Capes, ambas no âmbito do CsF (Foto; Arquivo pessoal)

“O doutorado vem se desenvolvendo de forma bastante produtiva, uma vez que tem me permitido absorver conhecimentos através de estudos realizados em parcerias com pesquisadores mundialmente renomados em suas áreas”, comenta Phillipe, que hoje só tem feito fotocópias para o seu doutoramento.

A trajetória de Phillipe, da marcenaria, no Brasil, ao doutorado, em Portugal, retrata o movimento provocado pelo programa na educação superior. Em atividade desde 2011, o Ciência Sem Fronteiras concedeu em todo o país 101.446 bolsas de estudos no exterior, em sete categorias, com ênfase na graduação. Informações divulgadas no último mês do relatório da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática (CCT) do Senado Federal, presidida pelo senador Cristovam Buarque, avaliaram positivamente o programa, incluindo um projeto de lei para sua instituição definitiva.  

Alunos egressos de graduação-sanduíche do CsF possuem uma taxa três vezes maior de ingressar em programas de mestrado e doutorado

Na UFJF, mais de 700 estudantes participaram do programa, coordenado pela Diretoria de Relações Internacionais (hoje UFJF – Internacional). Para a coordenadora do programa, Rossana Melo, “a imagem do Brasil mudou muito no exterior e o programa, apesar dos desafios, teve extremo sucesso. O benefício para os alunos foi realmente histórico”.

Rossana ressalta que o desempenho dos alunos criou amadurecimento e laços com as instituições receptoras, facilitando, inclusive, o retorno de vários estudantes para programas de mestrado e doutorado. De acordo com o documento da CCT, alunos egressos de graduação-sanduíche do CsF possuem uma taxa três vezes maior em relação aos demais no ingresso em pós-graduação. Estudantes do CsF ingressaram em maior proporção em cursos de mestrado e doutorado com conceitos 5, 6 e 7.

De Michigan a Maine: uma carreira sem fronteiras

Gustavo Lima da Silva, atualmente estudante do quarto ano de Engenharia Civil na UFJF, foi bolsista do CsF em agosto de 2013 e fez turismo. Turismo profissional: cruzou 1279 km, do estado de Michigan a Maine, para conseguir uma oportunidade de estágio na multinacional Brookfield Asset Management.

Aceito pela Wayne State University, em Detroit, fez disciplinas na sua área preferida, que era a de transportes. Também fez cadeiras em disciplinas teóricas de Gerenciamento de Processos, nas quais obteve bons resultados. Quando o calendário ofereceu uma pequena folga, Gustavo enviou seu currículo por e-mail. “Consegui um estágio na Brookfield. É uma empresa multinacional ligada à geração de energia elétrica. Fiz entrevista por telefone e, nas férias de verão, me mudei de Michigan para o Maine, sede da empresa. Fiquei três meses para o estágio e tive ali minha primeira experiência profissional. Para o meu currículo foi muito bom”, afirma.

Gustavo encarou o desafio também como oportunidade de praticar a língua estrangeira, e o aluno que chegou aos EUA com uma noção rudimentar do inglês, hoje é professor de uma famosa rede de curso de línguas em Juiz de Fora.

Viajar e tirar o máximo do intercâmbio não foi problema para Gustavo. “Eu consegui conciliar muito bem as duas partes. Inclusive com estágio – que era remunerado – consegui juntar dinheiro e viajar bastante. Não me atrapalhou em nada. Minha atitude foi basicamente seguir o calendário: na hora de estudar, estudar; na hora de folga, aproveitar”.

Nous sommes Paris: intercâmbio e gratidão

Segundo pesquisa do DataSenado, 68% dos ex-bolsistas do CsF afirmaram ter transferido a colegas e professores conhecimentos adquiridos no intercâmbio e 67% disseram manter contatos acadêmicos resultantes da experiência de estudos no exterior.  É o caso de Fernanda Neumann, atualmente mestranda de Engenharia de Biocombustíveis e Petroquímica pela UFRJ.

 Dos frutos recolhidos no período, destaca uma possível patente e muita experiência científica (Foto: Arquivo pessoal)

Dos frutos recolhidos no período de intercâmbio, Fernanda Neumann destaca uma possível patente e muita experiência científica (Foto: Arquivo pessoal)

No dia 2 de agosto de 2012, Fernanda, que cursava o último ano do curso de Química na UFJF, foi aceita através do programa CsF pelo Institut de Chimie de Substance Naturelles (ICSN), em Paris. Ali assumiu durante um ano a função de estagiária-pesquisadora em um estudo na área de química orgânica, que buscava a síntese de princípios ativos capazes de combater doenças mentais. Dos frutos recolhidos no período, destaca uma possível patente e muita experiência científica. “Do ponto de vista acadêmico, aprendi muito ao ter contato com cientistas renomados da área. Cheguei a assistir palestra de um prêmio Nobel. Também o fácil acesso a aparelhagem de ponta que não temos acesso aqui no Brasil ofereceu bons resultados técnicos e meus produtos deram muito certo, inclusive com publicação de artigo e provável estabelecimento de patente”.

No laboratório cosmopolita falava três diferentes línguas todos os dias: francês, inglês e português. “É diferente o nível de responsabilidade num laboratório de pesquisa. Meu desenvolvimento em termos de postura cresceu muito”, comenta. Tanto trabalho não a impediu de conhecer outros países nos momentos de folga, como Bélgica, Inglaterra e Itália. Depois de receber tanto da França, foi tocada pelo terceiro lema da república: fraternidade

Fernanda é representante da Rede Ciência sem Fronteiras, iniciativa de ex-bolsistas do programa que promovem ações de compartilhamento da experiência adquirida no exterior com a sociedade brasileira. “Voltei com vontade de retribuir com algo o investimento feito. Primeiro, continuando na minha iniciação científica, ajudando o laboratório. Depois de formada, queria saber como continuar. A rede é exatamente isso. Uma reunião de ex-alunos do CsF que tem vontade de mudar alguma coisa. Podemos formar, assim, futuros líderes com novas ideias para mudar, principalmente, a situação das ciências, tecnologia, inovação e educação no Brasil”.

A Rede CsF existe em diversos estados e sua representação local já está em atividade na UFJF. O grupo promoveu em dezembro uma campanha de arrecadação de material escolar para escolas carentes e planeja novos projetos para 2016. Mais informações podem ser encontradas no site www.redecsf.org.